Diversas unidades do 737 MAX estacionadas em área da Boeing em Seattle, Washington (EUA) (Foto: REUTERS/Lindsey Wasson)
A Boeing cancelou o acordo de compra do controle da divisão de jatos comerciais da Embraer por 4,2 bilhões de dólares, o que deverá levar a uma batalha legal entre as empresas, com a fabricante brasileira afirmando que a companhia norte-americana rescindiu o contrato indevidamente.
“Há vários meses temos mantido negociações produtivas a respeito de condições do contrato que não foram atendidas mas, em última instância, essas negociações não foram bem-sucedidas”, disse Marc Allen, presidente da Boeing para a parceria com a Embraer, em comunicado à imprensa. “O objetivo de todos nós era resolver as pendências até a data de rescisão inicial, o que não aconteceu”, acrescentou.
Horas após a manifestação da Boeing, a Embraer respondeu afirmando em um duro comunicado à imprensa que o cancelamento da transação ocorreu com a companhia norte-americana fazendo “falsas alegações”.
“A empresa buscará todas as medidas cabíveis contra a Boeing pelos danos sofridos como resultado do cancelamento indevido e da violação do MTA (acordo inicial entre as empresas)”, afirmou a Embraer sem citar valores. “A Embraer acredita que está em total conformidade com suas obrigações previstas no MTA e que cumpriu todas as condições necessárias” até o prazo de sexta-feira.
A companhia brasileira afirmou ainda que “a Boeing rescindiu indevidamente o MTA e fabricou falsas alegações como pretexto para tentar evitar seus compromissos de fechar a transação e pagar à Embraer o preço de compra de 4,2 bilhões de dólares”.
Segundo a Embraer, a Boeing agiu esta maneira por causa de “à falta de vontade em concluir a transação, sua condição financeira, ao 737 MAX e outros problemas comerciais e de reputação”.
DESDE 2018
O fracasso nas discussões interrompe planos da Boeing para ampliar sua atuação no mercado de aviação regional depois que a rival Airbus comprou as operações da rival da Embraer, Bombardier, no segmento.
Em julho de 2018, a Boeing acertou um acordo inicial para comprar 80% da área de aviação comercial da Embraer para fazer frente à Airbus no mercado de aviões para até 150 passageiros e acessar uma nova base de engenharia e manufatura de baixo custo.
A perspectiva de rompimento dos grupos foi reportada pela Reuters na sexta-feira, último dia para que as empresas chegassem a um acordo definitivo.
No sábado, pouco antes da Boeing confirmar o cancelamento do acordo, fontes afirmaram à Reuters que a companhia norte-americana havia comunicado à Embraer sua recusa em ampliar o prazo de negociações.
Fontes próximas do assunto afirmaram que a Boeing levantou objeções sobre financiamento e questões legais da transação, o que a Embraer considerou como uma tentativa deliberada da companhia norte-americana para forçar o fim do negócio.
“A Boeing foi duramente atingida pela crise do coronavírus e encontrou mecanismos para quebrar o contrato”, disse uma fonte no Brasil com conhecimento direto das discussões.
Outras fontes afirmaram que a disputa girou em torno do valor que a Embraer tinha investido na unidade de aviação comercial na expectativa de um acerto final com a Boeing, bem como o progresso de cumprimento de condições técnicas e jurídicas.
Uma fonte nos Estados Unidos negou que a Boeing deliberadamente cancelou o acordo e afirmou que a Embraer sabia há mais de um ano sobre o prazo e das várias condições para implementação do negócio.
E enquanto a transação recebeu aprovação de autoridades de defesa da concorrência de vários países, inclusive do Brasil, a União Europeia definiu prazo até o final de agosto para se manifestar sobre a transação.
FUNDAMENTAL PARA O FUTURO
A diretoria da Embraer defendia há anos o acordo, afirmando que ele era fundamental para garantir o futuro da companhia, principalmente após a aquisição das operações de aviação regional da Bombardier pela Airbus.
“A Boeing exerceu seu direito de rescindir após a Embraer não ter atendido as condições necessárias”, afirmou a companhia norte-americana no comunicado. “É uma decepção profunda. Entretanto, chegamos a um ponto em que continuar negociando dentro do escopo do acordo não irá solucionar as questões pendentes”, acrescentou Allen.
A Embraer incorreu com uma série de custos para separar os negócios de aviação comercial para que a Boeing pudesse exercer o controle sobre ela. No início deste ano, a companhia brasileira pagou as despesas para todos os funcionários tirarem férias coletivas de duas semanas para preparar a empresa para a conclusão do negócio.
O sindicato dos metalúrgicos de São José dos Campos (SP), principal base produtiva da Embraer, citou dados do balanço da companhia brasileira de 2019 para afirmar em comunicado neste sábado que o processo de venda custou à empresa 485 milhões de reais. “Exigimos que este prejuízo seja ressarcido pela Boeing.”
“Defendemos que o governo brasileiro cumpra o seu papel em favor da nossa soberania e reestatize a Embraer para que, diante dos efeitos colaterais a serem provocados pela ruptura do acordo, agravados pelas consequências econômicas causadas pela pandemia do coronavírus, os empregos e direitos dos trabalhadores sejam preservados integralmente”, defendeu a entidade.(Marcelo Rochabrun, Tim Hepher e Tatiana Bautzer/Reuters)
LEIA NOTA OFICIAL DO SINDICATO DOS METALÚRGICOS
“Com ruptura de acordo com a Boeing, Embraer tem de ser reestatizada e garantir estabilidade no emprego
“A rescisão do acordo de compra da Embraer pela Boeing, anunciada neste sábado (25) pela empresa norte-americana, é uma reviravolta em uma transação marcada pelo desprezo aos interesses nacionais e dos trabalhadores brasileiros.
“Desde o início, o Sindicato dos Metalúrgicos de São José dos Campos posicionou-se contrário à venda porque a Embraer é um patrimônio nacional estratégico para o país e não precisa de aliança com parceiros internacionais para sobreviver.
“Na transação que estava em curso, prevaleciam exclusivamente os interesses da Boeing, que pretendia sugar todo conhecimento e potencial da Embraer.
“O processo de venda custou à empresa brasileira R$ 485 milhões em 2019, segundo demonstrativo financeiro da própria Embraer. Exigimos que este prejuízo seja ressarcido pela Boeing.
“Pela reestatização e estabilidade
Defendemos que o governo brasileiro cumpra o seu papel em favor da nossa soberania e reestatize a Embraer para que, diante dos efeitos colaterais a serem provocados pela ruptura do acordo, agravados pelas consequências econômicas causadas pela pandemia do coronavírus, os empregos e direitos dos trabalhadores sejam preservados integralmente.
“Neste momento, é imprescindível que seja garantida a estabilidade no emprego para todos os trabalhadores da Embraer, que especialmente agora passam pelo medo do desemprego.
“A alta capacitação dos trabalhadores fará a diferença em favor de uma empresa alinhada com os interesses verdadeiramente brasileiros e que não submeta o destino da vida de milhares de trabalhadores à perversa lógica do lucro.
“A Embraer nasceu como uma empresa nacional e assim continuará.
Sindicato dos Metalúrgicos de São José dos Campos e Região”
Noticia: Jornal do Brasil