O discurso do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) em ato na Paulista, em São Paulo, no domingo, 25, deve ser usado no inquérito da PF sobre tentativa de golpe. Diante de apoiadores, Bolsonaro citou a “minuta do golpe” e minimizou a existência do documento que ele é suspeito de ser o mentor. Ele convocou o ato de domingo para se defender de investigações. Uma delas atribui ao ex-presidente a redação e a revisão da tal minuta, cujo objetivo seria anular o resultado das eleições de 2022 e evitar a posse de Lula. “Golpe é tanque na rua, é arma, é conspiração. Nada disso foi feito no Brasil. Por que continuam me acusando de golpe? Porque tem uma minuta de decreto de estado de defesa. Golpe usando a Constituição? (…) Deixo claro que estado de sítio começa com presidente convocando conselho da República. Isso foi feito? Não. É o Parlamento que decide se o presidente pode ou não editar decreto de estado de sítio. O da defesa é semelhante. Ou seja, agora querem entubar em todos os nós um golpe usando dispositivos da Constituição cuja palavra final quem dá é o Parlamento “, afirmou Bolsonaro. Agora, existe a possibilidade de Bolsonaro ser chamado a depor novamente, desta vez sobre suas declarações na manifestação. O advogado Paulo Amador da Cunha Bueno, da defesa de Bolsonaro, disse que o rascunho da minuta encontrado na sala do ex-presidente, em Brasília, é o mesmo documento que estava armazenado no celular do tenente-coronel Mauro Cid e que foi apreendido pela PF.”O ex-presidente, a fim de tomar pé de todos os elementos constantes na investigação solicitou a mim que encaminhasse ao seu telefone celular o referido documento.” Ainda segundo o advogado, Bolsonaro, que não gosta de ler arquivos na “tela diminuta” do celular, pediu o documento impresso. A PF tem usado falas do ex-presidente que consideram suspeitas em suas investigações. A primeira foi a reunião ministerial de abril de 2020, juntada aos autos da investigação sobre suspeita de interferência política na PF. Depois, a reunião com embaixadores em que o então presidente atacou as urnas eletrônicas e a Justiça Eleitoral embasando ação no Tribunal Superior Eleitoral (TSE) que resultou na condenação do ex-presidente à inelegibilidade. No inquérito que apura a atuação de uma “organização criminosa” na tentativa de golpe, a gravação de uma outra reunião ministerial, de julho de 2022, passou a integrar a investigação. No encontro, Bolsonaro cobra uma reação ao TSE e fala em pôr em prática um “plano B”. Na avaliação do advogado Daniel Bialski, a existência de uma minuta e o fato “de as pessoas conversarem a respeito de golpe ou manifestação contra a conduta política do Brasil” não é punível no campo penal. Segundo o criminalista, a conduta poderia ser moralmente punível, mas o fato de o ex-presidente mencionar o documento “não configura qualquer tipo de agravante”, principalmente tendo em vista que “este fato, em si e por si, não foi executado”. O ato na Paulista ocorreu dias após Bolsonaro se negar a responder questionamentos em depoimento na PF. Na quinta-feira passada, a corporação acompanhou oitivas de 23 investigados. Dentre eles, 16 se calaram, tal como Bolsonaro e os generais Augusto Heleno, Braga Netto e Paulo Sérgio Nogueira.
Foto: NELSON ALMEIDA / AFP