O Flamengo e o BRB
Artigo ESPORTE

O Flamengo e o BRB

 

 

Luiz Henrique Borges

 

Brasília receberá os dois melhores clubes, não só do Brasil, mas também de toda a América do Sul, neste final de semana para a disputa da Supercopa do Brasil. Nacionalmente, nos últimos cinco anos, o Palmeiras e o Flamengo venceram 4 campeonatos brasileiros e, pensando no nosso continente, eles dominaram as últimas quatro edições da Copa Libertadores com dois títulos para cada uma das equipes.

A Supercopa do Brasil é um daqueles campeonatos que, denomino equivocadamente de caça níquel, marca o verdadeiro início da temporada brasileira, o primeiro título. O erro não se encontra na pequena importância que a conquista representa entre todas as disputas que ocorrerão no futebol brasileiro, mas em decorrência dos preços exorbitantes dos ingressos, como destaquei na crônica da última semana, chamar a disputa de caça níquel. Seria mais adequado denominá-la de “caça ao ouro” ou “enche os bolsos”.

Em minha opinião, o Flamengo possui um elenco um pouquinho mais qualificado que o Palmeiras, no entanto, dois aspectos precisam ser levados em conta e, talvez, eles invertam o levíssimo favoritismo da equipe carioca em relação ao seu adversário paulista. Nós estamos no início da temporada, ou seja, os times estão distantes técnica e taticamente do máximo ou do que de melhor eles podem apresentar e o estágio de treinamento acaba por reduzir uma suposta diferença que possa existir entre eles, deixando-os em um patamar mais próximo.

O segundo aspecto, que a meu ver pode ser o diferencial positivo para o Palmeiras, é a longevidade do trabalho de Abel Ferreira. Enquanto Vítor Pereira assumiu o seu cargo há poucos dias no rubro-negro carioca, ou seja, ele ainda está conhecendo os atletas e implantando sua filosofia de trabalho e de jogo, já o alviverde paulista não altera sua comissão técnica desde outubro de 2020.

Eu adoraria assistir no estádio o que acredito que será uma grande partida de futebol. No entanto, como iria com um amigo flamenguista, eu tentei comprar, ainda na semana passada, os ingressos com meia entrada na parte reservada para a torcida do clube carioca. Apesar de ser cidadão de Brasília, contribuir com os impostos para a cidade, eu não sou cliente do banco BRB, patrocinador do Flamengo, que privilegiou os seus clientes nos primeiros dias de venda. Acreditando na lisura das empresas que estão organizando o evento e comercializando os ingressos, me parece que os clientes flamenguistas do BRB adquiriram todos os ingressos com meia entrada e, para nós, simples mortais, só restaram os caros ingressos inteiros.

Há, ainda, no momento em que elaboro a crônica, a possibilidade de comprar ingressos mais baratos, a famosa meia entrada, nas áreas palmeirenses. Da minha parte, não haveria qualquer problema, eu iria adquirir com prazer os ingressos e, confesso, que a minha torcida será pelo Palmeiras. No entanto, fico imaginando o meu amigo Guilherme, como todo fanático, ele é um escandaloso, infiltrado e tendo que compartilhar o espaço com os palmeirenses. Certamente ocorreria uma das duas situações, ou ele sofreria um ataque cardíaco em virtude da exigida e necessária contenção de suas emoções ou correríamos algum risco de vida com as comemorações sempre exageradas de meu amigo. Diante de tal situação, acho bem mais prudente assistirmos ao jogo pela TV.

Me incomoda bastante saber que o BRB, um banco de economia mista e que tem como seu principal acionista o governo do Distrito Federal, unidade da federação que arrecada parte dos meus impostos, patrocina, com valores vultosos, uma equipe de futebol carioca e, me irrita ainda mais, saber que os clientes do citado banco são favorecidos na compra dos ingressos em detrimento de todos os demais torcedores e até outras pessoas que gostariam ou precisariam, como é o meu caso, de assistir ao jogo ao lado da massa rubro-negra.

Para mim, a política de marketing do BRB, particularmente em relação aos ingressos, é a atualização, para o futebol, de uma clássica expressão cunhada por Celso Furtado para explicar a economia cafeeira de fins do século XIX e início do XX: a socialização das perdas. Em outras palavras, a instituição financeira é um banco estatal e no momento em que ele favorece os seus clientes em detrimento do restante da população do DF, o banco está garantindo as vantagens para os seus, enquanto ele divide os “custos” com toda a população. Se o procedimento fosse tomado por uma instituição privada eu entenderia perfeitamente, mas não é o caso.

Como apreciador do futebol e sem pensar nos lucros do banco, no retorno do marketing e nos ganhos dos acionistas, eu considero muito mais coerente que o valor mínimo destinado ao Flamengo, R$ 32 milhões, fosse integralmente investido nos clubes do Distrito Federal. O fortalecimento do futebol local seria muito mais interessante para os moradores do “quadradinho” e que apreciam o principal esporte nacional.

Particularmente, se tratando de bancos, sempre usei a máxima de um amigo e ex-colega de trabalho que, ao receber uma das inúmeras chamadas telefônicas dessas instituições financeiras que insistem em nos irritar tentando fazer suas vendas, afirmou peremptoriamente: “se o negócio é bom para o banco, certamente é ruim para mim”.

Recentemente, acionistas minoritários do banco alegaram que o patrocínio ao rubro-negro carioca causou prejuízo à instituição financeira, uma vez que mais da metade dos clientes oriundos da parceria, que tiveram cartões de crédito aprovados, estão inadimplentes. Sendo verdade, é o governo do Distrito Federal que cobre o prejuízo e isto fará com que a máxima de meu amigo tenha que ser reescrita: “se o negócio é bom para o clube, certamente é ruim para o banco”. Entendo que o BRB deve, seja para aplacar as críticas, seja para esclarecer a população local em relação ao patrocínio, trazer a máxima transparência na divulgação dos dados financeiros para que não haja prejuízo para os lados envolvidos.

Da minha parte, botafoguense convicto, se não for por obrigação nas relações de trabalho, jamais terei uma conta no BRB. O meu suado dinheirinho não irá financiar o meu maior adversário. Inicio aqui uma campanha: “Se é bom para o Flamengo, não é bom para você! Abra uma conta em um banco que não invista no seu rival”. Convenhamos que é uma campanha muito mais racional, inteligente e civilizada do que as mensagens racistas contra o Vinicíus Júnior ocorridos na branca e metropolitana Espanha.