Autor: Felipe Bächtold | Folhapress | Foto: Fábio Pozzebom/ AgBr
Uma das principais pendências judiciais do entorno de Baleia Rossi (MDB-SP), candidato à presidência da Câmara, envolve pagamentos em espécie em benefício de uma empresa que tinha a mulher dele como sócia e que pertence ao irmão do deputado.
Paulo Luciano Tenuto Rossi é réu desde o ano passado em ação penal eleitoral em São Paulo, acusado de receber da Odebrecht R$ 1 milhão em dinheiro vivo pago durante a campanha de 2014 por trabalhos da produtora Ilha Produção Ltda, que pertencia também a Vanessa da Cunha Rossi, esposa de Baleia.
O irmão, conhecido como Palu, também está com parte de seus bens bloqueados em decorrência desse processo, juntamente com o ex-candidato a governador Paulo Skaf (MDB), que é presidente da Fiesp (federação das indústrias de São Paulo).
Skaf e Paulo Luciano são acusados no processo, aberto em maio pelo juiz eleitoral Marco Antonio Martin Vargas, de corrupção, lavagem de dinheiro e caixa dois. De acordo com a denúncia da Promotoria Eleitoral de São Paulo, a Odebrecht se comprometeu com o MDB a destinar R$ 6 milhões à campanha de Skaf naquele ano por meio do Departamento de Operações Estruturadas, divisão responsável por pagamentos dissimulados apelidada de “departamento de propinas”.
Dessa quantia prometida, diz a denúncia, R$ 1 milhão em espécie acabou indo para Paulo Luciano, na época contratado pela candidatura para a produção de vídeos por meio da Ilha Produção. Vanessa Rossi e Baleia não são alvos da denúncia dos promotores e dizem não ter nenhuma relação com as acusações feitas.
Ela foi sócia da Ilha Produção no período em que ocorreram os pagamentos e se desligou da firma em 2017. Baleia foi fundador da empresa, que anteriormente se chamava Whale Produções, e se retirou da sociedade em 2003, quando sua esposa passou a integrar o quadro de sócios.
A produtora ampliou sua atuação em campanhas políticas no início da década passada. Da candidatura de Skaf, em 2014, recebeu formalmente R$ 3,25 milhões, segundo a prestação de contas oficial entregue à Justiça Eleitoral na época.
A denúncia considera que, por trás do pagamento de R$ 1 milhão em espécie, havia a intenção da empreiteira de potencializar ganhos irregulares com o poder público, cooptando pretendentes a cargos eletivos. Argumenta que, como a finalidade era ilícita, os valores circulavam por meio de doleiros e em espécie, com uso de codinomes e senha, o que visava ocultar a prática das autoridades.
Na época, ainda era legal a doação empresarial para candidatos. Para se enquadrar nas regras, porém, o pagamento da Odebrecht deveria ser registrado à campanha de Skaf, e o comitê do candidato, então, deveria remunerar a empresa fornecedora. Como isso não aconteceu, o Ministério Público entende que houve o crime eleitoral de caixa dois.
Contra Paulo Luciano, pesam registros de entregas de dinheiro da Odebrecht em duas ocasiões na época da campanha. “Hotel merak Paulo a senha e trilho entregar 500 mil”, diz mensagem enviada por um dos envolvidos no pagamento, citada na denúncia.
Os promotores apontam que os arquivos de hóspedes de fato listam Paulo Luciano no dia marcado do pagamento, em setembro de 2014. O mesmo ocorreu em uma ocasião anterior, também para a entrega de outros R$ 500 mil, em um outro hotel em São Paulo.
Em defesa prévia entregue no processo, os advogados de Paulo Luciano afirmaram que o recebimento de valores em dinheiro não representa por si só uma dissimulação de recursos de origem ilícita e que essa situação, poderia “quando muito, vir a configurar, crime contra a ordem tributária”.
A mesma denúncia do Ministério Público também faz acusações de teor parecido contra o publicitário Duda Mendonça, responsável pela candidatura de Skaf naquele ano, e contra um dos filhos do marqueteiro. Duda, porém, já fechou acordo de colaboração com a Polícia Federal homologado pelo STF (Supremo Tribunal Federal).
Além do R$ 1 milhão pago a Paulo Luciano, diz a denúncia, a denúncia aponta que a Odebrecht pagou R$ 4,2 milhões em espécie a pessoas indicadas por Duda. O juiz eleitoral notificou a defesa do marqueteiro para juntar ao processo o acordo de colaboração premiada.
Paralelamente à denúncia, Marco Antonio Vargas determinou o sequestro de bens e valores de Skaf e Paulo Luciano, limitados à quantia de R$ 5,2 milhões para cada um, como forma de prevenir eventual “dilapidação patrimonial”. Na ordem, o magistrado escreveu que há prova da materialidade e indícios quanto à prática dos crimes contra os dois.
“Tal conjunto de elementos de informação e indícios, por ora, confirmam a tese acusatória e, assim, se revelam capazes de reforçar a convicção sobre o envolvimento dos acusados e requeridos no complexo esquema de pagamento de propina, omissão de dados à Justiça Eleitoral e lavagem de capitais.”
Na denúncia, os promotores eleitorais também afirmam que há uma segunda investigação pendente, na qual é investigado suposto caixa dois a favor de Baleia Rossi por meio de outros pagamentos em espécie à Ilha Produção. Esse inquérito, sigiloso, ainda está em andamento.
A ação em tramitação e a investigação são decorrentes da chamada Lava Jato Eleitoral de São Paulo, conjunto de procedimentos enviados ao juizado eleitoral de primeira instância depois que o Supremo Tribunal Federal decidiu, em 2019, que caberia a esse ramo do Judiciário julgar casos de crimes como corrupção e lavagem em situações em que há conexões com financiamento de campanha.
O Ministério Público paulista criou no ano passado uma espécie de força-tarefa que já denunciou políticos como os ex-governadores Geraldo Alckmin e José Serra (PSDB).
OUTRO LADO
Em nota encaminhada à reportagem, o deputado federal Baleia Rossi, por meio de sua assessoria, disse que nem ele nem a esposa, Vanessa, têm ligação com as acusações em tramitação na Justiça Eleitoral de São Paulo contra seu irmão.
“Baleia Rossi não tem nenhuma relação com essa acusação e nenhum valor ilícito recebeu. A mulher dele não é parte no caso citado”, diz a nota.
A defesa de Paulo Luciano Tenuto Rossi afirma que a denúncia “não tem procedência alguma” em relação a ele.
“Basta ver que ele foi acusado de corrupção passiva sem jamais ter sido funcionário público; de lavagem de dinheiro em hipótese na qual o STF afasta a sua ocorrência; e falsidade eleitoral sem sequer ter sido candidato em qualquer pleito.”
A defesa também reiterou que Paulo Luciano não cometeu crimes. “Aguarda-se, no momento, decisão do Juízo Eleitoral sobre a defesa apresentada que, se acolhida, levará à extinção do processo.”
No processo, os advogados também afirmaram que ele não foi ouvido durante a investigação e que isso prejudicou seu direito de ampla defesa.
A reportagem também procurou a defesa de Paulo Skaf, que disse que as acusações formuladas pelo Ministério Público são de caráter “infundado e fantasioso”. Afirma que a Justiça Eleitoral ainda não decidiu sobre o recebimento definitivo da denúncia, nem sobre a viabilidade da acusação dos promotores. Disse ainda que houve o arresto cautelar do valor equivalente ao objeto da acusação e que apresentou recurso, em agosto, contra essa medida na segunda instância. Também afirma que todas as receitas e despesas da candidatura de 2014 foram declaradas à Justiça Eleitoral, conforme manda a lei.