Copa do Mundo: a primeira emoção
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Copa do Mundo: a primeira emoção

Por: Luiz Henrique Borges.

Não é mentira! No dia 1º de abril ocorreu o sorteio dos grupos da Copa do Mundo no Catar. Em virtude da pandemia, os últimos três classificados, provenientes da fase de repescagem, só serão conhecidos em junho, mas ocuparão na sexta-feira, o pote 4. Independente de quem serão os últimos convidados para a festa que começa em novembro, é certo que a competição será, como de costume, equilibrada.
Depois de olhar os potes que dividem as seleções para o sorteio, eu confesso que preferiria não enfrentar na primeira fase a Alemanha ou a Holanda. Tenho certeza que a recíproca também é verdadeira. Mas, mesmo que isto ocorra, acredito que o Brasil possui uma equipe capaz de superar qualquer adversário dos potes 3 e 4 e classificar-se para a fase seguinte, já no formato eliminatório, momento em que a onça passa a beber água. Por isso, será muito interessante, após a formação dos grupos, verificarmos os cruzamentos futuros.
Todos os campeões mundiais, exceto a Itália, estarão presentes. A eliminação da Azzurra deve servir de alerta tanto para os otimistas quanto para os pessimistas. A Copa do Mundo é uma competição de tiro curto e, neste sentido, o “momento” dos atletas e das equipes, em novembro e dezembro, quando a Copa será disputada, é determinante para o sucesso ou fracasso na disputa. O tempo exíguo que as seleções terão para se preparar para o Mundial deverá acentuar tais aspectos.
Vejamos como o “momento” é importante nas competições de caráter eliminatório. A Itália, após não se classificar para a Copa de 2018, renovou seus atletas e até seu estilo jogo, adotou uma postura mais ofensiva e envolvente. Muitos jornalistas ficaram encantados com o futebol que a levou ao título da UEFA Euro de 2020, disputada em 2021. Apenas alguns meses depois do triunfo em Londres, dois profundos dissabores. Na fase de grupos das Eliminatórias, diria que, com grande dose de ironia, a Azzurra perdeu a vaga direta para o Mundial para a Suíça que ainda tem, na defesa, o pilar do seu jogo.
Mas o pior ainda estava por vir. Na primeira partida da repescagem, a Itália, atuando em casa, enfrentou e foi derrotada pela, sejamos sinceros, inexpressiva Macedônia do Norte. É a segunda Copa do Mundo consecutiva sem a presença dos tetracampeões.
O fracasso italiano, além de ressaltar a importância, particularmente para as fases eliminatórias, dos atletas estarem muito bem em todos os aspectos – físico, tático, técnico e mental – gerou duas outras lições. A primeira: as seleções mais técnicas deverão enfrentar na Copa do Mundo sistemas defensivos extremamente fechados, como ocorreu com a Itália contra a Macedônia do Norte. As duas dezenas de pernas dos jogadores macedônios pareciam se transformar em milhões delas a cada chute italiano, criando obstáculos que se mostraram intransponíveis. Sendo assim, as equipes mais gabaritadas precisarão treinar e aprimorar os esquemas táticos que sejam capazes de superar os ferrolhos defensivos.
Segunda lição: A Copa do Mundo não necessariamente premiará as seleções que se preparam melhor durante o ciclo entre um e outro mundial. A Itália, que parecia ter entrado em um ciclo virtuoso, sequer irá a Copa do Mundo. Lembro, com saudosismo, da Seleção Brasileira de 1982. A equipe dirigida pelo magistral Telê Santana vencia seus adversários e encantava. No entanto, em 5 julho, em uma tarde menos feliz, o Brasil, que jogava pelo empate, acabou derrotado por 3X2 para a Azzurra e foi eliminado da Copa por uma seleção que havia enfrentado todos os tipos de problemas e dificuldades durante sua preparação para o Mundial. Os comandados por Enzo Bearzot, após as vitórias contra a Argentina e, principalmente, contra o Brasil, decolaram com a propulsão de mil foguetes rumo ao título.
No embalo da valorização dos treinadores estrangeiros e que retrata os nossos profissionais como completos analfabetos na matéria, o trabalho do Tite, no meu entender, não é avaliado corretamente. Infelizmente, nos últimos tempos, em uma sociedade polarizada, tenho muita dificuldade de distinguir as críticas que são proferidas por pessoas capacitadas e que estão embasadas em conhecimentos táticos e técnicos e outras que reverberam apenas as questões político-ideológicas.
Ouvi, ao longo das Eliminatórias, diversas críticas em relação aos jogadores convocados. Mas sejamos sinceros, você, comandando a Seleção Brasileira, alteraria radicalmente os jogadores escolhidos por Tite ou faria apenas alterações pontuais? Pensando ainda nos convocados, Tite soube, ao contrário do que ocorreu no Uruguai ou no Chile, seleções bastante envelhecidas, renovar o grupo e não me parece, aprendizado da Copa passada, fechar os seus olhos para o aparecimento de novos valores.
Outra crítica comum é que o futebol da Seleção não é brilhante. Concordo! Mas quem atua de forma brilhante? Os franceses, atuais campeões do mundo e que possuem um elenco até mesmo superior ao brasileiro, receberiam diversas críticas por todos aqueles que entendem o futebol como posse, imposição e domínio territorial.
O Tite é medroso e retranqueiro. Nos 17 confrontos realizados pelo Brasil nas Eliminatórias, a equipe venceu 14 deles e empatou os outros 3. O aproveitamento foi de 88,2%. A seleção marcou 40 gols, média de 2,35 por jogo e sofreu apenas 5. É o melhor ataque e a melhor defesa da competição. Em algumas momentos eu acho que os analistas pensam que a defesa e o ataque são elementos incompatíveis ou setores estanques. A equipe que sabe defender não pode ser eficiente no ataque e vice-versa. Nada mais simplificador. Não há dualidade entre defesa e ataque, o futebol é orgânico, ou seja, os setores precisam trabalhar em harmonia e conjuntamente. O Brasil demonstrou ter um sistema defensivo sólido e que, simultaneamente, era capaz de se impor, de pressionar e de agredir com eficiência os seus adversários.
Tenho certeza que alguém, neste momento, se levantará e com a voz convicta afirmará: mas o nível do futebol na América do Sul está muito baixo. Ora, então o Brasil fez o que era esperado e com muito mais competência do que os seus principais rivais do continente. Ao enfrentar adversários tecnicamente mais fracos, a seleção soube impor o seu jogo e vencer, na maior parte das vezes, com facilidade. Em relação ao nível do futebol sul-americano e a outra polêmica que ganhou espaço no jornalismo esportivo, o de não enfrentarmos seleções europeias antes da Copa do Mundo, pretendo, em breve, escrever sobre a temática e apimentar a discussão.
Particularmente, não considero encantador o futebol praticado pela Seleção Brasileira. Longe disso. Mas as boas campanhas da equipe de Tite ao longo dos últimos cinco anos não foram frutos apenas do acaso. Há um modelo de jogo implantado e que fará do Brasil, como de costume, um dos favoritos para conquistar o mundial.