Se você estiver interessado em conhecer mesmo as raízes mais profundas da situação constrangedora por que passa nosso país com seus índices sociais e econômicos incompatíveis com as potencialidades naturais do seu território, procure-as no MEC. Ou melhor, no sistema educacional brasileiro.
Na realidade, a ascensão de algum nome para dirigir o setor da educação não tem nada a ver com o procurar fazer com que o sistema apresente os melhores resultados para o seu fim específico: Educação. O que se espera do nomeado é que ele comande as tropas de combate de um dos lados na guerra ideológica que há muito tempo se estabeleceu nesse sistema, a partir das universidades públicas. Não importa se o governo é de direita ou de esquerda, o critério de escolha é o mesmo. A guerra ideológica é sem quartel e sem tréguas. Bruta e burra!
Os movimentos de insatisfação e rebeldia de alunos e professores no seio das universidades tiveram início glorioso, historicamente nasceram do espírito aguerrido e libertário dos jovens ao se moverem contra as ditaduras e contra o arbítrio por todos os quadrantes do planeta. No Brasil não foi diferente. Movimentos como os da Faculdade de Direito da USP, no Largo de São Francisco em São Paulo, as ações das entidades estudantis de apoio a campanha “O Petróleo é Nosso” são exemplares. Mas, pela própria natureza, eram episódicos. Cessadas as causas próximas, reduziam-se as lutas, o bom senso indicava que universidades tinham outras destinações no contexto das funções sociais.
A explosão cultural do ambiente universitário em maio de 1968, em Paris, abalou estruturas em todo o mundo, modernizando-as. Seus agentes, por lá, continuam ativos, críticos e vigilantes, salvo por bolsões radicais, incorporaram-se à dinâmica das atividades acadêmicas e voltaram ao leito normal do dia a dia. Por aqui inventamos e vivemos na Guerra da Estultice.
Muitos professam um credo, segundo o qual poderiam sequestrar precocemente as mentes dos jovens para uma ideologia pré-determinada, mesmo que comprovada como ineficaz. O sistema educacional, e particularmente a universidade, seria crucial nessa estratégia. As diversas unidades da Universidade pública seriam ocupadas, bem como o sistema administrativo central da educação. Uma verdadeira guerra psicossocial, insidiosa. E isso há décadas vem sendo posto em prática. A Revolução pela Revolução Cultural!
O que se espera de qualquer universidade é sua neutralidade ideológico-partidária, que seja espaço aberto ao debate de ideias na procura da verdade, das melhores soluções, da harmonia de cores, formas e sons. Daquilo que Einstein disse certa vez que o que ele mais queria era “conhecer o pensamento de Deus”. Para alguém menos religioso, eu diria que o gênio científico do Século XX, gostaria de conhecer, plenamente, todas as relações e estruturas dos entes do Universo. Este é na realidade o pretencioso objetivo primevo das universidades.
O procedimento, que a longo prazo tornaria o mundo do jeito pensado por Gramsci, o teórico comunista, como era de esperar, criou reações. Os ministros que vão para o MEC e seus principais auxiliares não vão cuidar do ensino, mas vão fazer a guerra. Tanto de um lado, quanto do outro, por isso não importa se entendem de educação, se são economistas, ou se trazem no currículo o pastoreio de muitas ovelhas de algum credo religioso. Têm que ser bons guerreiros, fiéis aos seus generais. E assim tem sido, desde há muito tempo!
Dizem que o último ministro caiu porque havia corrupção no ministério.
Corrupção, ora, ora! Isso não é exclusividade do MEC e se resolve com facilidade. Ela deixa de existir, mesmo nos casos mais agudos, condenando-se o juiz, transformando-se COAF em UIF, cancelando-se sentenças por erros do CEP do Tribunal. Nesses casos não há guerra, o cachimbo da paz está sempre aceso e as bocas estão sempre dispostas a tragadas da fumaça da conciliação, que atiradas à nossa cara nos adormece.
Não me perguntem sobre as consequências da Guerra da Estultice. Suas armas não são tão escandalosamente visuais e auditivas como as das bombas russas na Ucrânia, mas os malefícios são irrecuperáveis. Vejamos: O índice de produtividade média do trabalhador brasileiro é dos menores do mundo. Nos exames Pisa de matemática, o Brasil se iguala aos países de menor qualificação; nenhum prêmio Nobel; poucas patentes industriais registradas; êxodo de cérebros; cortes das verbas para as áreas de C&T; atividade industrial decrescente.
É a Guerra da Estultice que impede que a inteligência nacional, reunida em suas diversas vertentes, as realistas e sensatas, formule um Projeto para o Brasil, que o ponha nos trilhos do desenvolvimento, da soberania e do seu real destino.
Ao sistema universitário público cabe a função de ser o diapasão que dê tom e ritmo a parte privada do ensino superior, ainda eivada dos vícios de um mercantilismo danoso, além da preparação dos melhores quadros para o desenvolvimento.
O mais importante, no entanto, é o inescapável compromisso de a universidade ser o espaço de reflexão das necessidades do país, das alternativas das políticas públicas e sociais, das suas consequências. Tudo dentro da civilidade própria do ambiente acadêmico, sem os arroubos e tentativas de imposição de pontos de vista pela força ou por assembleísmos fraudados.
Tempos melhores virão!
Virão?!
Crônicas da Madrugada. Danilo Sili Borges. Brasília – Abr. 2022
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O autor é membro da Academia Rotária de Letras do DF. ABROL BRASÍLIA
Fonte: Danilo Sili Borges | Foto: Divulgação