Por 372 votos favoráveis a 108 votos contrários, a Câmara dos Deputados aprovou na noite desta terça-feira, 23, o projeto do novo arcabouço fiscal, encaminhado pelo governo de Luiz Inácio Lula da Silva (PT). O novo conjunto de regras que deve substituir o teto de gastos segue agora para o Senado Federal. O presidente do Senado, Rodrigo Pacheco, reiterou que a casa legislativa está pronta para avaliar e aprovar o novo arcabouço fiscal ainda no primeiro semestre. O governo também deve apresentar novo pedido de urgência para votação rápida do arcabouço, como na Câmara, para que o assunto não precise passar por comissões temáticas.
A vitória elevou o moral do ministro da Fazenda, Fernando Haddad, que sinalizou na tarde de terça estar muito otimista com a próxima pauta prioritária do governo: a reforma tributária. Segundo o ministro, o objetivo é conseguir quórum ainda superior ao de emenda constitucional, de 308 votos, para a votação – apesar da medida precisar apenas de maioria simples para passar. A ideia de Haddad é consolidar uma base de votação para medidas fiscais para que o próximo passo da pauta econômica, a reforma tributária, também seja aprovada quando chegar nas fases de votação na Câmara.
A votação, agendada para quarta-feira, foi adiantada após acordo entre os líderes parlamentares. Assim como em outras votações importantes na legislatura passada, Lira manobrou para apressar a matéria e conseguir um quórum alto, numa demonstração de força. A sessão foi aberta às 13h e a pauta com a previsão da votação só foi divulgada depois das 18h. O texto votado foi apresentado na tribuna pelo relator, Cláudio Cajado (PP-BA).
O projeto recebeu 103 propostas de emenda, isto é, modificações para o texto. Apesar da pressão das bancadas para alterar o texto, o relator afirmou que as as sugestões acatadas foram de redação, sem mudança no mérito da proposta. Mesmo com a pressão da base governista, o relator decidiu manter o Fundeb e o piso da enfermagem dentro do limite dos gastos, seguindo as regras fiscais. A inclusão do fundo de desenvolvimento da educação básica, em particular, foi alvo de críticas de parlamentares do PSOL, PSB e até PT durante os debates no plenário.
O texto aprovado nesta terça-feira pelos deputados prevê duas regras principais: uma de resultado primário, que prevê zerar o déficit público no próximo ano e também limita o aumento das despesas a 70% do ganho real da receita no ano anterior — ou 50% em caso de descumprimento da meta de resultado primário — não podendo ser inferior a 0,6% ou superior a 2,5%. Hoje, o orçamento federal só tem crescimento nominal (pela inflação). Caso haja o descumprimento, serão acionados também gatilhos, como a proibição a criação de cargos, alteração de estruturas de carreiras, novas despesas obrigatórias ou ampliação de incentivos fiscais.
Os gatilhos foram incluídos pelo relator da proposta, o deputado Cláudio Cajado (PP-BA), após avaliação de que o texto enviado originalmente pela Fazenda deixava frouxa a perseguição às metas. No entanto, o relator manteve a alteração da Lei de Responsabilidade Fiscal feita pelo Ministério da Fazenda que retira o descumprimento de meta fiscal como crime de responsabilidade. Além dos gatilhos, uma das principais alterações apresentadas por Cajado é a volta do contingenciamento obrigatório, tornado facultativo no projeto do governo.
A regra de crescimento real será usada nos anos futuros, e não apenas entre 2024 e 2027, como previa o projeto. O substitutivo também manteve a regra da meta de resultado primário anual, que terá um intervalo de tolerância de 0,25% do Produto Interno Bruto (PIB), para mais ou para menos. A meta para 2024 é zerar o déficit e a previsão para 2025 e 2026 é superávit de 0,5% e 1%, respectivamente.
Pelo substitutivo apresentado, o governo precisa avaliar a cada bimestre o comportamento das receitas e das despesas, como já acontece hoje. Se houver risco para o cumprimento da meta fiscal do ano, terá de contingenciar os gastos discricionários. Se ainda assim houver descumprimento da meta fiscal ao fim do ano, medidas de ajuste serão acionadas no ano seguinte, de forma gradual.
No primeiro ano, o governo não poderá criar cargos, alterar estruturas de carreiras, novas despesas obrigatórias ou ampliar incentivos fiscais. Além disso, a despesa só crescerá 50% da variação real da receita do ano anterior. As medidas valem por um ano. Se no ano seguinte a meta for atingida, elas deixam de valer. Mas, se não for, voltam mais duras no segundo ano, com novas vedações, como concessão de reajuste de funcionalismo, admissão de pessoal e realização de concurso público. As mesmas proibições serão aplicadas se as despesas obrigatórias ultrapassarem 95% das despesas primárias.
Fonte: Veja | Foto: Marcos Oliveira/Ag Senado