O Brasil vai virar a Venezuela
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O Brasil vai virar a Venezuela

Luiz Henrique Borges

Na semana passada, eu pensei em escrever sobre a ridícula apresentação da Seleção Brasileira contra a fraca Venezuela. O jogo foi tão ruim, que logo após o gol do Brasil, no início do segundo tempo, adormeci e só acordei quando o locutor, para o meu espanto, narrou o gol do nosso adversário. Ainda entorpecido, pensei que estava sonhando, me ajeitei no sofá, cocei os olhos, dei um preguiçoso bocejo e vi que os caras realmente tinham empatado o jogo.

Acordei na sexta-feira convicto de que, ao voltar do dentista, iria assistir com mais atenção a partida para elaborar a crônica da semana. Fui ao consultório do Dr. Marcelo Abate, profissional que visito há mais de uma década e que eu recomendo, desta vez para um procedimento mais invasivo, resultado dos problemas advindos com o envelhecimento. Tudo correu bem e sequer precisei tomar a receitada Dipirona Sódica caso sentisse desconforto. No entanto, ao chegar em casa, cansado, preferi não escrever. Deixei para hoje.

Contra a Venezuela, o Brasil manteve a bola em seus pés, aspecto corriqueiro nos times dirigidos por Diniz, mas de forma pouco produtiva. Atuando contra um oponente muito fechado, a armadilha de recuar a bola e atrair o adversário para o campo de ataque abrindo espaços no sistema defensivo não teve efeito contra os venezuelanos que, cientes de sua inferioridade técnica, não tiveram pudor de montar duas compactas linhas defensivas e aguardar, pacientemente, o deserto de ideias da Seleção Brasileira.

Almocei na casa dos meus pais no Domingo. Questionado sobre o jogo, falei que para furar uma retranca como a venezuelana seria preciso dar velocidade ao jogo, seja atuando pelos lados do campo, seja nas trocas de passes que envolveriam o oponente. O Brasil não mostrou tática e tecnicamente capacidade para realizar qualquer uma das duas coisas. Ao final da conversa, vaticinei que jogaríamos melhor contra o Uruguai, afinal nossos eternos rivais, reconhecidamente de muito melhor técnica, atuariam em casa e, mesmo trazendo mais perigo para a defesa brasileira, dariam mais espaços. Queimei a língua!

Meu Deus do Céu, que jogo ruim foi aquele de terça-feira! Teve um momento, quando o primeiro tempo já se encaminhava para o final, que procurei no “Oráculo Google” se os dois contendores haviam assinado, talvez ainda no próprio dia 17/10, um acordo de paz para ninguém dar um chutinho, por mais fraquinho que fosse, para o gol de seu “inimigo”. Vou falar para vocês, meus leitores, o negócio estava tão ruim que fiquei até surpreso quando o Uruguai conseguiu marcar o primeiro gol na certeira cabeçada de Darwin Núñez.

Juro que não estou sendo sarcástico, mas não me preocupei, em relação ao jogo da Seleção, quando o Neymar deixou o gramado. Não é de hoje que o ex-craque brasileiro não tem mais a explosão e o vigor físico que lhe permitia ser tecnicamente um jogador diferenciado. Eu também não acredito que o alto rendimento do atleta será retomado no “fortíssimo” futebol árabe. Mas quem sabe eu não volte a queimar a língua!

Não sei o que o Diniz tinha na cabeça quando colocou o Richarlison no lugar do contundido Neymar. A substituição deixou o Brasil ainda mais desorganizado e o time conseguiu a proeza de piorar o que já estava péssimo. Além do atacante do Tottenham estar jogando pedrinhas, oh fase ruim da moléstia, o Brasil precisava, e precisará para os próximos jogos, melhorar muito o meio-campo que é fundamental para a construção das jogadas. Não adianta encher o time de atacantes se a bola não é tratada com carinho na zona central do gramado.

Não sei se era minha televisão, se são os meus olhos, ou se a minha idade está me deixando muito crítico, mas o Casemiro era tão rápido quanto um tanque de guerra atolado na lama. O outro volante do time, o tal do Bruno Guimarães, também é lento, sem criatividade e pouco combativo. O que mais me preocupa é ler que a CBF está discutindo a reintegração do Lucas Paquetá como se ele fosse solucionar todos os nossos problemas. Só pode ser brincadeira.

Será que o Vinícius Júnior e o Rodrygo, craques do Real Madrid, estiveram em campo contra a Venezuela e o Uruguai? Acho que os caras que entraram em campo eram sósias dos dois jogadores. É verdade também que a lentidão da equipe brasileira não potencializa o jogo de Vini Júnior que foi facilmente anulado pelos seus marcadores ao ficar espremido ao lado da linha lateral do campo. Já o Rodrygo parecia uma barata tonta, improdutivo, correndo de um lado para o outro.

Jamais concordei com o chavão usado pela imprensa de que “é um jogo para esquecer”. O péssimo futebol apresentado por nossa seleção, nas duas partidas, não deve e não pode ser esquecido, ele precisa ser dolorosamente lembrado para que a Comissão Técnica e os jogadores busquem por soluções. É simplesmente inadmissível que a Seleção Brasileira passe 90 minutos e só dê 2 finalizações, como ocorreu contra o Uruguai.

Entendo que o naufrágio técnico e tático de nossa seleção não pode ser debitado apenas na conta do Diniz. Sem querer comparar a capacidade do treinador do Fluminense com a do astro internacional chamado Guardiola e, é preciso dizer, sabendo que eles possuem estilos de jogos diferentes, há, no entanto, um ponto de interseção. O trabalho desenvolvido por eles exige tempo de treinamento. Nos clubes, os dois treinadores encontram, em alguma medida, esse recurso, mas nas seleções o tempo é um artigo ainda mais raro do que os jogadores extraordinários.

No entanto, a inflexibilidade de Diniz em ajustar as suas ideias à realidade que ele tem nas mãos faz com que ele também tenha uma boa parcela de culpa no repugnante futebol apresentado pelo Brasil. O treinador busca implantar, de imediato, o seu conceito de futebol, que é muito diferente do trabalho anterior. As transições, para não serem traumáticas, precisam ser graduais. Os jogadores, especialmente nos momentos mais tensos das partidas, perceptivelmente confusos, não conseguem aplicar os conceitos do dinizismo e tentam, também infrutiferamente, retornar ao modelo anterior. É o caos!

Se há uma entidade capaz de tomar decisões infalivelmente atabalhoadas, ela é a CBF. Os comandantes do nosso futebol erram sempre. Diniz, um homem dividido entre dois empregos, foi escolhido como um remendo, uma espécie de band-aid, até a chegada do Ancelotti. Caso o acerto com o treinador italiano esteja realmente sacramentado, não teria sido melhor, como remendo, trazer alguém da sua confiança e que entende como o italiano irá proceder quando (e se) ele assumir a equipe?

Para a felicidade dos conservadores brasileiros, o mantra, marcado pela simplicidade (ou desonestidade) cognitiva, repleta de equívocos históricos e econômicos, se transformou em realidade. O Brasil realmente virou a Venezuela, só que foi no futebol.