O BAILE DO FONSECA
Artigos

O BAILE DO FONSECA

Este é um dos sucedidos mais engraçados da nossa história e  foi contado pelo próprio protagonista. Desde muito pequeno Fonseca já era muito conhecido por tocar terror na rua que morava. Filho de comerciantes, se criou na labuta cotidiana ajudando a sua mãe. Para abastecer a loja, esta senhora, periodicamente, viajava para a cidade de São Paulo, momento em que o seu filho virava o “rei” do casarão que eles possuíam na cidade. Na ausência da mãe, Fonseca reunia os amigos e fazia bailes apoteótico regadas a música, churrasco, cachaça e orgias – não necessariamente nesta ordem. Toda santa noite, a tranquila e pacata casa de família se metamorfoseava em um antro de sedução e luxúria – para total desespero dos vizinhos. O principal amigo de Fonseca era Noel Rosa, um sujeitinho baixinho e fortinho que adorava participar das putarias ali realizadas. Aliás, adorava participar de qualquer coisa, desde que fosse “zero oitocentos”. Quando os amigos o questionavam, ele alegava com a cara mais limpa do mundo que pagar por luxúria contrariava os seus princípios morais, fazendo que o dono da casa saísse completamente do prumo:

– Que sovinice é esta, seu unha de fome? Come, bebe, é o primeiro a entrar e o último a sair e não dá um tostão? Sou pai de ninguém não! Daqui pra frente vai ser assim: Quem não pagar não participa da farra! Pressionados, os amigos – que não eram bobos nem nada, fizeram logo uma vaquinha e contribuíram imediatamente para “o belo quadro social”. Noel Rosa quando se viu ameaçado de perder a boquinha, vendo o amigo puto da vida “falando as do fim” pra ele, chegou a tremer na base: – Rapaz, aqui ninguém é paletó pra ficar nas costas dos outros não. Daqui pra frente vai ser assim: Quem quiser comer tem que pagar, quem quiser beber tem que pagar e quem não pagar não entra! – Não era que Fonseca tinha razão? Afinal de contas o prazer não era dividido para todos? Então, porque só ele tinha que pagar? A partir daquela data, decretou: – Quem não pagar, não come e pronto! – O verbo neste caso, seria literal. Noel Rosa conhecia o amigo e sabia que ele estava falando sério, assim, sem alternativas, prometeu aos amigos que ele ficaria encarregado de trazer da cidade vizinha de Divisa Alegre, quatro lindas garotas a custo zero para o baile, caberia à Fonseca e aos amigos o “latifúndio” dos comes e bebes. Claro que os amigos desconfiaram. Custo zero? Noel arcaria  com tudo aquilo? Logo ele? Diante da pressão, viram-se obrigados a dar um voto de confiança ao malandro. No desespero, convenceu a trupe que era amigo íntimo de uma linda amiga que lhe devia um favor, e que esta amiga traria três outras, tão lindas quanto ela e que, por ser dono da casa – e dos comes e dos bebes – Fonseca ficaria incumbido de escolher a garota que melhor lhe conviesse. Dito e feito. O jovem comerciante ficou contando os dias para a sua querida mãezinha se ausentar.

Finalmente chega o dia e só por garantia, fizeram logo uma reunião com Noel Rosa que reafirmou o compromisso, alegando estar tudo dentro dos conformes, embora, exigisse bebidas de qualidade, já que as “meninas” – finas e elegantes – não beberiam bebidas falsificadas! Pela manhã, Fonseca e os amigos – obviamente, sem Noel Rosa que não era chegado a pegar no batente – fizeram uma bela de uma faxina na casa, decorando-a com papeis e luzes coloridas. Enquanto os excitados amigos decoravam o ambiente, Noel, logo cedinho, botou a sua melhor roupa e foi sorrateiramente para o ponto de ônibus esperar o quarteto de mineiras que abrilhantaria o baile e – por tabela – o desejo dos voluptuosos amigos.

A ansiedade contribuiu para que as horas demorassem uma eternidade para passar… Nove da noite, luzes piscando, som no volume máximo, os amigos mordendo um ao outro (de tão excitados) e eis que adentra ao recinto o  malandro Noel com um quarteto de fechar o trânsito! As gatas eram tão bonitas, mas tão bonitas que Fonseca ficou boquiaberto por quase cinco minutos, com a baba a lhe escorrer queixo abaixo. Cada uma mais linda que a outra. Belos e encaracolados cabelos, roliços pares de pernas, mini sainha deste tamanhinho, enormes peitos siliconados pulando para fora das blusas, saltos altíssimos se equilibrando delicadamente, nádegas graciosamente jogadas de um lado para o outro, comida para todos os gostos… Negra, ruiva, loira, morena… Perfumes importados, lábios carnudos, jeitinho dengoso de falar, enfim… Um verdadeiro paraíso!

– Taí, falei ou não falei que eu traria! – Falou Noel estufando o peito e sendo efusivamente aplaudido! – E mais, conforme prometido, meu amigo Fonseca vai escolher a garota que ele quiser para virar a noite. – Viva Fonseca! – Gritaram em uníssono. As moças ficaram perfiladas fazendo beicinho enquanto o pobre do Fonseca queimava as pestanas para escolher a que mais lhe agradava. Escolhia a loira, trocava pela negra, voltava atrás e preferia a morena e muita indecisão depois, eis que ele escolhe a mais alta de todas. Mini-saia jeans, botas canos longos até os joelhos, lábios Rouge carmim, os seios estufados e uma bunda que mataria de inveja qualquer funkeira.

A partir daí a noite foi só alegria, cada qual no seu cada qual, beijos aqui, abraços ali, chupões acolá, amassos alucinados, gemidos aluados, uivos desconcertantes, mordidelas dilacerantes, gritos histéricos, músicas patéticas, bebidas turbinadas, petiscos diversificados e o prazer correndo solto pelo recinto… Lua cheia no céu e as horas passando em uma velocidade estonteante. Quem mais bebia e beijava era Noel! Aliás, por ser baixinho, se sentou logo no colo de uma bitela de uma negra que tinha o dobro do seu tamanho e entre um gole e outro era mordiscado levemente na orelha, acariciado no peitoral e beijado ardentemente no pescoço, matando Fonseca de inveja que naquela altura já estava achando que a negra de Noel era mais bonita que a ruiva bunduda escolhida por ele. Três da manhã e Fonseca já não sabia mais onde colocar o desejo, assim, resolveu catar a ruivaça pelos imensos cabelos e levá-la quase que a força para a alcova principal, deixando cada um dos amigos em um dos quartos, ficando a imensa sala (com a geladeira repleta de guloseimas) à disposição de Noel e sua gata. Imagine aí se não era a vida que ele pedira a Deus? Quem passasse naquele momento na porta da casa, se excitaria só de ouvir os uivos e gemidos emanados porta afora. Nos quartos os amasso corriam soltos, mão naquilo, bocas ardentes, tapas, beliscões, mordiscadas e por aí ia… Em seu quarto, Fonseca se deliciava com a competência e experiência da ruiva peituda. Ainda estavam nas preliminares e ela já o levara ao “paraíso” três vezes ininterruptas! O céu da sua boca ficara pequeno para a volúpia da atrevida, sexy e ágil língua da garota que o desvirginava por completo, entrando sorrateiramente em orifícios jamais profanados, tais como o buraco da orelha ou os rasgos salientes das ventas. Neste ínterim, o inexperiente Fonseca desfalecia literalmente entre prazer e dor, sufocado com as narinas presas entre dois duríssimos montes de silicone! A diaba da ruiva parecia insaciável, embora, toda vez que ele tentava catá-la de frente ela se virava e o enlouquecia com o rebolado sensual da sua derriére duríssima, mal-ajambrada e mal escondida pelo finíssimo fio dental preto que deixaria qualquer um descontrolado. Nos quartos a gemedeira continuava em um ritmo alucinante, parecia até uma orquestra entrosadíssima cheia de graves e agudos intercalados por delicados e sutis gemidos… O universo conspirava para o que parecia ser uma noite inesquecível quando o afoito e incontrolável Fonseca deu uma bistunta e resolveu passar a palma da mão onde não devia e se surpreendeu ao agarrar um mastro de todo tamanho apontando na sua direção! No auge do desespero, ele chegou a se lembrar do Pau da Bandeira que ele era obrigado a conduzir no dia da pátria quando menino.

– Que é isso, gente? Que porra é essa?!!! – Gritou Fonseca desesperado.  Desnecessário dizer que a brochada foi inevitável e antes mesmo da ruiva (ou seria um ruivo?) falar alguma coisa, ele correu em direção ao seu guarda-roupa e já voltou segurando um facão de não sei quantas polegadas que de tão amolado chegava a reluzir no escuro!

– Ah, safado! Eu vou te matar, vou te esfolar, vou te retalhar igual a carne do sertão, miserável dos infernos… Você não vai sair daqui vivo, hoje! – Falava aos berros, pelado e descontrolado com os olhos querendo saltar das pálpebras!

– Que é isso benzinho? – O que é isso? A ruiva perdeu a oportunidade de ficar calada! Mal deu tempo de pegar a mini sainha e as botas de canos-longos e já foi recebendo nas costas uma lapada de facão!

– Saia da minha casa agora, cabra safado! Você está pensando que eu sou o que? –  A partir daí o que se seguiu foi extremamente surreal. Imagine a cena: Um quarto enorme, uma ruiva linda só de fio dental e um maluco, nu em pelo, munido de um facão descendo a ripa na pobre coitada que saltava mais que pulga e se esquivava mais que caçote. Fonseca batia com toda a força que possuía enquanto a “ruiva” pulava de um lado, saltava do outro, se contorcia e gritava tentando fugir dos golpes do enfezado garanhão.

– Me acode, me acode que este homem está doido! Ele vai me matar! – Uma lambança danada, corre-corre, gritos, apupos, desespero e… Logo todos invadiram a alcova:

– O que foi, pessoal! O que foi? O que aconteceu? Oxen, Fonseca! Pare com isso, moço! Enlouqueceu?!! Deste jeito você vai matar a menina!

– Eu estou louco?! Louco está este vagabundo do Noel, que entupiu minha casa com esta renca de viados!

– Êpa! – Gritou Noel abraçando firme a sua negra! – Vagabundo, não! Você não queria mulher de graça? Então?!! Tá reclamando de que?

– E isto é mulher, seu cabra safado?

– E que diferença faz? – Tentou argumentar Noel quando viu o amigo furioso jogar violentamente o facão na sua direção. Mal teve tempo de se abaixar enquanto o lindo aquário da mãe do amigo se transformava em cacos.

– Fonseca, se acalme. Assim você vai ferir alguém. – Falou um dos amigos.

– Quer saber de uma? Vou meter o pau em todo mundo! – Gritou Fonseca no auge da infezação e quando se abaixou para pegar o facão não ficou ninguém dentro da casa. Deram no pé, homens para um lado e as “meninas” para o mesmo lado, só que correndo muito mais!

– Volte aqui lote de vagabundos! Volte aqui!

Como o dia já estava amanhecendo, muita gente viu… Descendo desembestados na pista, em direção à ponte, um bando de pessoas completamente nuas, correndo assustadas com roupas e calçados nas mãos, perseguidas violentamente pelo filho de dona Irene, (famosa comerciante local), pra lá de alucinado, espumando os cantos da boca, berrando feito um desmiolado, armado de pedras, paus, facas e facão, jogando o que achava na direção dos perseguidos…

– Volte aqui “felas” de uma égua! Volta aqui viados safados!

Você voltou? As pobres “garotas” estão correndo até agora!

 

FIM

Luiz Carlos Figueiredo

Escritor e Poeta

Cândido Sales, Bahia. Quadras de Agosto de 2023.

Lua Nova de Inverno.