Evento contempla as matrizes ancestrais que foram esquecidas na história e na literatura brasileira
Literatura, ancestralidade e expressões artísticas prometem marcar a 5ª edição da Feira Literária de Mucugê – Fligê. O evento literário acontece entre os dias 10 e 14 de agosto, na cidade de Mucugê, região da Chapada Diamantina. Este ano, a feira traz como tema Literatura e Ancestralidades.
De acordo com a curadora do evento, Ester Souza, a temática contempla as matrizes ancestrais que foram esquecidas na história e na literatura brasileira. “O tema desta edição recompõe o fluxo de produção e de conhecimento literário que não aconteceu devido à pandemia. Ele ressalta que a ancestralidade é um encontro intergeracional, dos ancestrais que não vingaram ou tiveram suas histórias apagadas, bem como daqueles que se perpetuam nas transmissões orais e visuais”, informa Souza.
De acordo com a curadora, as mesas literárias foram baseadas nas raízes ancestrais presentes nas obras e nos temas de cada convidado. Há rodas de conversa que discutem também acerca do ofício da escrita dos autores participantes.
“As mesas da programação principal se orientam pela presença da ancestralidade em relação à obra literária de cada convidado. A mesa 1, por exemplo, tem como personagem o rio Paraguaçu, leito literário de mais de oito feiras. Vai abordar suas águas ancestrais e narrativas literárias em diferentes épocas e autorias. Outras mesas recuperam o específico da escrita do convidado para enquadrar as dimensões de gênero e espiritualidade, buscando recepção do público para essa reverberação cultural”, explica Ester.
A programação aborda ainda histórias e narrativas dos povos originários. “Eles estão em autorias tupinambás, payayá, fulkaxó e pankararu, nas mesas e expografias Manto Tupinambá, E(m)Trancados Sonhos, e em sessão de cantigas e histórias para crianças. Estão também na relação da literatura com o meio ambiente e com o planeta em suas dimensões de cuidado da terra indígena” ressalta a porta-voz.
Além de reverenciar as raízes e origens ancestrais, a Fligê representa uma grande importância para a cultura, literatura, educação e economia da cidade de Mucugê, de acordo com Ester.
“Um evento literário como esse, que já está na sua quinta edição, além de impactar na economia local, forma públicos leitores, tanto da infância como de outros grupos. A maior relevância é constatar que coletivos culturais e educacionais da cidade abraçam a feira como um espaço de formação literária e humana”, aponta a organizadora.
Povos originários
Reverberando as matrizes indígenas e africanas, o evento tem, nesta atual edição, o objetivo de compartilhar os saberes, as culturas e os estudos literários acerca das ancestralidades. Além disso, as expressões culturais da região da Chapada também serão discutidas no evento.
“As matrizes são a presença indígena e africana. A pesquisa literária narra essas culturas, como, por exemplo, o livro Torto Arado, de Itamar Vieira Júnior, que foi lançado na Fligê de 2019 e inclui o jarê como uma das manifestações dos encantados. O jarê é uma espiritualidade específica da Chapada Diamantina, bem como os cantos dos anciãos. A presença da matriz africana se relaciona em manifestações de dança, música e culinária”, observa Ester Souza.
Quem também estará participando do evento é a escritora carioca Eliana Alves Cruz. A autora chega para discutir a respeito da importância da escrita ancestral na literatura e na memória do país.
“A gente vai abordar a forma como a memória é colocada e exercitada na nossa literatura. Vamos falar desse passado e principalmente do presente. Nós, autores, somos testemunhas do nosso tempo, temos uma responsabilidade com a memória do futuro. A memória é algo muito importante e crucial para se discutir. É a partir disso que vamos pensar. O Brasil não possui uma identidade somente, mas várias”, exclama a escritora.
A importância da matriz africana dentro da literatura e cultura brasileira é outro ponto que será reverberado pela autora.
“Esse tema é muito importante para mim. Tudo que escrevo é para questionar o apagamento negro do Brasil. Temos uma herança vinda de povos africanos que a gente precisa resgatar na nossa escrita e literatura. O continente africano está em nós. Desde as palavras do nosso vocabulário, até os hábitos e a culinária. Isso tudo está entranhado na essência do Brasil, faz parte de todos, brancos, negros, indígenas. O que tento fazer é só evidenciar e trazer isso à tona”, revela a carioca.
Segundo o escritor Ednaldo Muniz, a feira exaltará também os anciãos e servirá de referência para o aprendizado dos mais novos. “Este evento será por nós e pelos nossos mais velhos, griôs e anciãos. Mostrará para os nossos jovens negros que podemos ser artista, escritor, médico e doutor. Esse é o significado de estar participando da Fligê. Fortalece o movimento, tira do esquecimento e imortaliza nossos mais velhos, mostrando aos mais novos que eles também podem ser príncipes ou princesas”, informa Muniz.
Já a ancestralidade indígena será tema da Mesa 3 com a escritora Denizia Kawany, que promete apresentar seus saberes e suas histórias de maneira bastante explicativa.
“Tenho três narrativas que marcam muito a história do meu povo e da literatura indígena como forma de luta e resistência. Tem narrativas também que contam como a gente se prevenir das doenças. Trago histórias sobre o marco temporal. Serão quatro narrativas que vou levar para a feira de uma forma mais política, didática e dinâmica”, comenta Kawany.
Vasta programação
Além das mesas literárias da programação principal, a Fligê terá também outras expressões culturais. Serão atividades dedicadas a todos os públicos. Para as crianças, a Fligêzinha terá uma programação especial que aproxima os pequenos da literatura, além de apresentações de histórias, cantigas e de curtas-metragens.
5ª edição da Feira Literária de Mucugê – Fligê / 10 a 14 de agosto / www.fligemucuge.com.br
Fonte: A Tarde | Foto: Divulgação