Crônicas da Madrugada
Autor: Danilo Sili Borges
Os que circulam pelas madrugadas veem jovens realizarem a difícil manobra denominada cavalo-de-pau, que consiste em fazer o veículo que pilotam dar na pista um giro de 180 graus, rodando sobre si mesmo. O carro de elevada potência tem a suspenção rebaixada para aumentar a estabilidade, reduzindo assim a possibilidade de capotamento. O mais importante é mesmo a habilidade do piloto e sua coragem. Muito garotos perderam a vida nesse tipo de manobra. Mas a vida é assim, escolhas são escolhas. A questão é quando provocam com seus bólidos acidentes que envolvem passantes.
Em sã consciência, ninguém pensaria em dar um cavalo-de-pau numa carreta carregada. Esses veículos são capazes de atingir velocidades elevadas e têm freios potentes, tudo o que é necessário para a arriscada operação. Não creio que essa ideia tenha, uma só vez, passado pela cabeça do mais aloprado de seus motoristas, por saberem do desastre que provocariam. Vidas e prejuízos incalculáveis ocorreriam. Condutores dessas grandes estruturas móveis têm responsabilidades pessoais e sociais.
Uma empresa, de qualquer porte é, do ponto de vista econômico e social, estrutura que se move no tempo, não devendo aplicar, no ambiente em que trafega, um cavalo-de-pau. Os prejuízos, principalmente, os de ordem moral, seriam incomensuráveis.
Buscando melhor desempenho, seus dirigentes, os CEOs (Chief Executive Officer) são substituídos, tal como o são os técnicos dos times de futebol. Gradativas alterações são feitas, adaptações a novos objetivos e estilos. Prevalece sempre o bom senso. Nenhum CEO propõe ou impõe à sua organização uma operação de cavalo-de-pau. Se ocorresse, o Conselho de Administração da empresa e seus acionistas e se for uma Estatal, o próprio governo, o colocariam na rua, com um sonoro pé na bunda. Todos os CEOs cercam-se de assessores que lhes prestam aconselhamentos técnicos, indispensáveis neste mundo tecnológico. CEOs que sonham com besteiras são corrigidos antes das 9h da manhã.
Na condução das empresas, em geral, não se admite estrelismo, comportamento histriônico. O histrionismo é uma doença, cujo risível portador faz de tudo para ficar em evidência e é até capaz de dar um cavalo-de-pau numa carreta para mostrar o seu poder, para mostrar que é “uma cascavel que um dia teve o rabo pisado”.
Um país é uma estrutura maior que milhões de empresas. O Brasil é um país com 210 milhões de colaboradores-habitantes, passageiros dessa carreta gigante.
O indicado para assumir a função de novo CEO, para conseguir receber as indicações para o posto, teve que apresentar certas qualidades de bom senso. Para tanto, chamou para junto de si gente que não gosta de cavalos-de-pau, como Henrique Meirelles, Pérsio Arida, Armínio Fraga, Edmar Bacha e Pedro Malan. Todos eles economistas com histórias profissionais de competência reconhecida e que emprestaram seus nomes para dar credibilidade a Lula na sua movimentação para a direita ideológica, o que lhe permitiu alcançar os votos necessários à vitória.
Antes de sentar-se à frente do volante da imponente carreta verde-amarelo, o eleito presidente começa a falar em dar um formidável cavalo-de-pau na economia do país. Os negócios reagiram, a bolsa caiu, o câmbio se tornou desfavorável ao Real. Uma pequena tempestade.
Arida, um dos criadores do Plano Real, é hoje componente da equipe de transição, tem se mostrado publicamente em oposição às declarações de Lula a respeito da política fiscal a ser adotada. Numa direção similar, Meirelles, que foi presidente do Banco Central em passado governo Lula, aparentando desconforto, não hesita em colocar suas posições.
Fraga, Bacha e Malan, no dia 17/11, na última quinta-feira, publicaram na Folha de São Paulo carta aberta alertando o presidente eleito para os prejuízos que suas declarações estão causando à economia nacional.
Note o leitor, que quando tão gabaritado quadro de assessores é levado a publicar documento público para se comunicar com o chefe, a luz vermelha do entendimento está acesa. Estaremos vivendo o risco do rompimento do diálogo de Lula com os que lhe falam sobre economia liberal?
Apenas a expectativa do cavalo-de-pau que Lula está anunciando e reafirmando, já nos faz prever, no fim da rampa de alguns meses, os destroços da carreta, como estão, ao que parece, antecipando, seus desprestigiados assessores, que, com certeza estarão fora da boleia da carreta, se essa perder o rumo.
Há os que pregam um recomeço geral, um novo Big Bang, a destruição da estrutura econômica criada por séculos de capitalismo e empreendedorismo. Que devemos voltar à tanga e à igualdade original para daí construirmos a sociedade ideal, reunindo os escombros das carretas desmanteladas no fim das curvas fatais. Esclareça-se que isso nunca foi conseguido. E que o mais perto a que se chegou foi a distribuição igualitária de pobreza e miséria em nome de justiça social! Ressalvando-se, é claro, para os componentes do partido único.
Que Deus proteja nossa carreta!
Crônicas da Madrugada. Danilo Sili Borges. Brasília – Nov. 2022
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O autor é membro da Academia Rotária de Letras do DF. ABROL BRASÍLIA