Autor:Luiz Henrique Borges
Durante muitos anos lecionei a disciplina de História Moderna e sempre me identifiquei com o pensamento Iluminista, particularmente com as explicações racionais. Sendo herdeiro de um pensamento que percebe o universo regido por leis mecânicas e impessoais, eu juro que não sou supersticioso. Nem no futebol! Contudo, não é muito bom a gente dar chance ao azar, não é mesmo?
Quando eu disputava minhas descompromissadas partidas com meus amigos, aos domingos de tarde, tinha por hábito usar sempre o mesmo uniforme. Short preto, camisa falsificada também preta do Manchester United e a meia do Botafogo. As muitas vitórias conquistadas indicavam que, ao usar o uniforme, dificilmente o resultado seria diferente.
Sempre assisto aos jogos do meu Botafogo e aos da Seleção Brasileira em pé, ao lado do sofá, gritando as instruções para os atletas. Enfim, não é superstição, mas são hábitos que surgiram ao longo do tempo, particularmente após os resultados positivos e as conquistas. Como afirmei, não que eu seja supersticioso, longe disso, mas imagine só se o meu time perder o campeonato só porque eu não segui o ritual corretamente? Não quero carregar tal culpa pelo resto dos meus dias.
Estamos há alguns meses de disputar uma nova Copa do Mundo e, apenas com o intuito de levantar as coincidências, nada supersticioso como o leitor verificará, percebi que até o momento foram disputadas 3 Copas em anos terminados em 2. Acho bacana, neste ponto, realizarmos uma breve digressão histórica.
Os mundiais começaram a ser disputadas em 1930, no Uruguai. A primeira Copa do Mundo que seria jogada em um ano terminado com 2 seria a de 1942. No entanto, em virtude da II Guerra Mundial, a disputa foi cancelada assim como em 1946, uma vez que o mundo ainda não havia se recuperado do sanguinário conflito que terminara em 1945. Foi no Chile, somente em 1962, que se jogou a primeira Copa do Mundo em um ano terminado pelo número dois.
Campeão em 1958, na Suécia, o Brasil lutava pelo bicampeonato quatro anos depois. Atuando na bela cidade costeira de Viña del Mar, banhado pelo gélido Pacífico, vimos Garrincha, sobretudo após a contusão de Pelé, comandar a Seleção Brasileira em direção ao título que foi conquistado na vitória por 3X1 contra a Tchecoslováquia.
Vinte anos se passaram. Em 1982, a Seleção Brasileira era mágica, ela vencia e encantava. Eu já considerava o tetracampeonato como favas contadas. A Revista Placar, que eu lia semanalmente, havia inserido em um dos seus números um adesivo já fazendo referência ao quarto título brasileiro. Nem esperei o início da Copa, ele foi imediatamente colado na janela do meu quarto. Quem poderia superar a habilidade, a criatividade e o jogo envolvente dos comandados pelo mestre Telê Santana?
A Copa foi disputada na Espanha e o Brasil venceu a União Soviética, a Escócia e a Nova Zelândia na primeira fase. Na etapa seguinte, atropelou a Argentina e jogava por um simples empate contra a Itália para avançar na competição. Há exatos 40 anos, no dia 5 de julho de 1982, vivenciei a maior tristeza que o futebol já me proporcionou e o “maldito” adesivo, colado açodadamente, ficou por anos me atormentando até que, assim como os sentimentos, ele foi se desbotando, se desfazendo e se tornou um incômodo borrão na janela assim como as lembranças daquela derrota.
Falhas individuais de nosso selecionado comprometeram o resultado da partida, certamente. Mas, jogamos bem. Martelamos até o final, contudo fomos parados nas defesas do incrível Dino Zoff, no vigor defensivo que caracteriza o futebol italiano e na inacreditável tarde de Paolo Rossi. O impossível se materializou na ensolarada tarde da mediterrânea Barcelona e trazia consigo um sentimento de infinita tristeza e frustração quando o juiz apitou o final de Itália 3 X Brasil 2. Ainda hoje, 4 décadas passadas, não gosto de reviver a tragédia do Sarriá, local em que o Brasil foi derrotado. Não perca tempo procurando o estádio de triste lembrança para os brasileiros no Google Mapas, ele foi demolido em 1997.
Chegamos em 2002. A Seleção Brasileira parte para a Coreia e o Japão desacreditada. Classificou-se para o Mundial na bacia das almas ao vencer, na última rodada, a Venezuela. A campeã de 1998, a França, era uma das favoritas, no entanto, eles se despediram ainda na fase de grupos da Copa do Mundo. A Argentina, outra favorita, seguiu o mesmo caminho dos franceses. Sem dois importantes adversários, aos poucos, a Seleção Brasileira, que contava com Ronaldo, Ronaldinho, Rivaldo, Roberto Carlos, Cafu, entre outros, foi se ajustando, encorpando e terminou levantando o pentacampeonato.
Passados mais vinte anos chegamos em 2022. Mesmo não sendo supersticioso, vejamos os dados e as coincidências que, sem dúvida, nos trazem muitas esperanças: o Brasil venceu duas das três Copas do Mundo em anos em que a disputa terminou em 2 (1962 e 2002). Perdemos em 1982, na Espanha, nome que inicia com uma vogal. No entanto, veja bem, conquistamos os títulos no Chile e na dupla Coreia e Japão, ou seja, ganhamos quando os países sede começavam com a letra “C”.
Os céticos e pouco racionais argumentarão que a o Japão também sediou a Copa. Eles não levam em conta dois aspectos cruciais em qualquer análise fria e tendendo para o cientificismo. O primeiro ponto, era Copa da Coreia e Japão, não do Japão e da Coreia. Em outras palavras, continuamos iniciando com a letra “C”. O segundo aspecto fundamental, se em 2002 o jogo final foi no Japão, não devemos nos esquecer, sejamos racionais e nada supersticiosos, que a Copa começou para o Brasil na Coreia, local em que jogamos a fase de grupos. Aonde será jogada a Copa de 2022? No Catar, iniciando com a letra “C”, que é a grafia considerada mais correta em português e, para mim, um bom augúrio para a Seleção Brasileira.
Outras coincidências podem ser buscadas como, por exemplo, a França foi campeã em 1998 e em 2018. Prenuncio de novo retumbante fracasso? Há também a possibilidade de se construir algumas interpretações muito criativas que deixariam Nostradamus no chinelo. Leiam, amigos, a que acabei de criar. Se você somar os números que formam o ano da Copa do Mundo, 2+0+2+2, você encontrará seis, exatamente o hexacampeonato buscado pelo Brasil. Nem Zagallo me superaria em tamanha criatividade.
Meus queridos leitores, como vocês tiveram a possibilidade de observar, eu realmente não sou supersticioso, mas todos os indicativos demonstrados e “comprovados” acima indicam claramente que o Brasil ganhará, no final do ano, mais uma estrela em sua camisa. Agora, como racionalista que sou, só falta eu fazer minhas promessas e achar, no fundo do armário, a camisa que usei em 2002. Depois disto, nada mais pode dar errado!