A Copa do Brasil também é previsível
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A Copa do Brasil também é previsível

Autor: Luiz Henrique Borges

A Copa do Brasil, competição que desde 2021 inicia com 92 equipes, conheceu, no meio de semana, seus oito classificados. Ouvi em um dos incontáveis programas de televisão que debatem o futebol no país, um jornalista afirmar que na Copa do Brasil, pelo seu caráter eliminatório, tudo pode acontecer e, para justificar a sua fala, relembrou o título conquistado, pelo Criciúma em 1991, quando a equipe catarinense era comandada pelo jovem treinador Luiz Felipe Scolari. Sua tese poderia ganhar um reforço se ele tivesse ressaltado que o título do Criciúma foi conquistado de forma invicta.

Sem entrar na discussão do peso da camisa de Juventude e Sport, campeões em 1999 e 2008 respectivamente, as duas últimas equipes de menor expressão nacional que conquistaram a Copa do Brasil foram o Santo André em 2004 e o Paulista em 2005. Partindo temporalmente do título do Sport, que é um gigante regional, mas não está na prateleira mais alta do futebol brasileiro, há exatamente 12 anos a Copa do Brasil é conquistada por equipes grandes e tradicionais do nosso futebol ou pelo emergente e cada vez mais estruturado e forte Athletico Paranaense. Sendo assim, refuto a tese do jornalista, o tempo das surpresas, que sequer eram tão frequentes, ficou no passado.

Algumas mudanças nas regras deram muito maior previsibilidade para a Copa do Brasil. Inicialmente, a premiação, ou seja, os valores pagos pela competição melhoraram consideravelmente e todos os clubes passaram a jogar com seus times principais. Se é preciso poupar algum atleta, isto será feito no Brasileirão, já que os eventuais pontos perdidos podem ser recuperados ao longo do campeonato.

Outra alteração muito importante merece ser contextualizada. A partir da edição de 2001, a CBF decidiu que os clubes que estavam na Libertadores da América não participariam da Copa do Brasil, devido ao conflito de datas, visto que os dois campeonatos eram disputados sobretudo na primeira metade do ano. No entanto, a proibição caiu em 2013, quando a Copa do Brasil se estendeu durante todo o ano. A partir daí os clubes que disputam a Libertadores, teoricamente os melhores do país, entram na Copa do Brasil a partir da terceira fase.

O resultado é que nos últimos nove campeonatos (2013-2021), apenas três vezes o campeão não foi uma equipe que jogou a Libertadores da América na mesma temporada: o Flamengo em 2013, o Palmeiras em 2016 e o Cruzeiro em 2017. Neste ano, todos os oito classificados na Copa do Brasil estavam ou estão envolvidos em uma das competições continentais. Atlético Clube Goianiense e o São Paulo estão na Copa Sul-Americana. O América Mineiro, o Fluminense e o Fortaleza jogaram a Libertadores. O Corinthians, o Flamengo e o Athletico Paranaense continuam na busca pelo título continental.

No futebol também vale a regra de “segue o dinheiro”. Os clubes mais estruturados e com os melhores orçamentos são os favoritos. Claro que as surpresas acontecem, sobretudo nas fases iniciais da Copa do Brasil e, particularmente, nos jogos únicos. Mas, após as mudanças descritas acima, quando a disputa afunila a “conversa” é outra. Há favoritos declarados e serão eles que lutarão pelo título.

A última fase foi marcada por grandes clássicos. O Fluminense venceu sem grande dificuldade o Cruzeiro. Entendo que o clube mineiro, maior vencedor da Copa do Brasil, fez excelente campanha e agora poderá se concentrar para a caminhada mais importante deste ano e que já se encontra bem pavimentada, o retorno à Série A.

São Paulo e Palmeiras terminaram iguais, uma vitória para cada lado e no placar agregado o resultado de 3X3. Nos pênaltis o tricolor eliminou o rival. O Fortaleza perdeu o jogo decisivo contra o Ceará, mas foi adiante por ter feito um gol a mais que o seu adversário. O América Mineiro varreu, despachou, destruiu o Botafogo. O Santos, na Vila Belmiro, foi incapaz de reverter a larga vantagem que o Corinthians havia construído em seus domínios.

O Flamengo conseguiu reverter o resultado contra o Atlético Mineiro em uma partida em que anulou inteiramente o seu adversário. Infelizmente, falas do Gabigol, afirmando que o Maracanã iria se tornar um inferno para o clube mineiro, que em tempos idos seria uma forma de estimular o público e valorizar o espetáculo, em tempos de violência e ignorância, o sempre provocativo e falastrão atacante do Flamengo pode ser extremamente mal interpretado e estimular as confusões provocadas pelos marginais que se travestem de torcedores.

Não estou afirmando que as palavras ditas pelo atacante do Flamengo desencadearam o ataque que o ônibus da delegação do Atlético Mineiro sofreu ao chegar no Maracanã para o duelo contra o rubro-negro. A mensagem que quero deixar é que o existente clima de animosidade e intolerância não deve ser excitado pelos atletas.

Outro ponto negativo foi a invasão de torcedores rubro-negros no Maracanã, fato que proporcionou cenas lamentáveis de pessoas caindo e sendo pisoteadas. No Mineirão, torcedores do Fluminense e do Cruzeiro brigaram e, pasmem, torcedores de duas organizadas do Atlético Mineiro brigaram no deslocamento para o Rio de Janeiro.

No entanto, o mais lamentável foi a atitude dos vândalos santistas na histórica Vila Belmiro. Após o apito final e eliminados pelo rival, não satisfeitos em arremessar rojões em direção da área defendida pelos corinthianos, alguns “torcedores” invadiram o gramado e um deles tentou agredir o goleiro Cássio. As cenas lamentáveis de correria que se seguiram só desvalorizam o futebol brasileiro.

Os apedrejamentos dos ônibus que levam os times ou os torcedores adversários se tornaram muito frequentes neste ano e as invasões de campo, mesmo que menos frequentes, são inadmissíveis.

Será que as medidas efetivas e duras só serão tomadas quando tivermos mortes de atletas ou membros de comissões técnicas? Os exemplos de torcedores mortos parecem não alterar o ânimo de nossas autoridades. Não é possível, em nosso mundo tecnológico, que os torcedores que apedrejam um ônibus, que invadem um gramado, que brigam dentro do estádio não sejam identificados, presos, processados e impedidos de adentrar uma arena esportiva pelo resto de suas vidas. Não é mais possível que os clubes se eximam de suas responsabilidades uma vez que o mandante é responsável pela organização do jogo ao lado do aparato da segurança pública.

Se o futebol exercita a rivalidade, a paixão pelo clube e não é o melhor espaço para a cortesia, ele também não pode ser o local do vandalismo, da violência, da incivilidade, da brutalidade, da discriminação e da ignorância. Nem tudo é válido, possível e aceitável em nome da paixão.