Autor:Luiz Henrique Borges
Em 1880, um novo clube de futebol surgiu na Inglaterra, o FC St. Mark’s. Pouco tempo depois a equipe ganhou uma nova alcunha e passou a ser chamada de Ardwick Association Football Club. Finalmente, em 16 de abril de 1894, ela foi rebatizada com o seu nome atual e que no último sábado entrou para o seleto grupo de campeões do torneio de clubes mais importante do futebol europeu. Falo do Manchester City que é a 23o agremiação a entrar nesta lista exclusiva. De quebra, a Champions voltou a ter um campeão inédito após mais de uma década e a Inglaterra ampliou sua marca como o país com o maior número de clubes campeões da competição, são seis no total (Manchester United, Liverpool, Chelsea, Nottingham Forest, Aston Villa e Manchester City).
Apesar da longevidade, o City só se tornou uma superequipe depois de ter sido adquirido pelo Abu Dhabi United Group (ADUG), uma empresa dos Emirados Árabes Unidos. Após a sua aquisição, há 15 anos, o Sky Blues, que não era um time da primeira linha do futebol inglês, passou a empilhar taças e mais taças, mas faltava uma, a mais desejada e também considerada a mais importante na Europa, a Champions League. No último sábado, a longa e tortuosa espera acabou e o torcedor do Manchester City pode gritar, esgoelar até ficar sem fôlego, que é o atual campeão da Europa e, o que é incomum, de forma invicta. Das suas 67 edições, só em 15 oportunidades isso ocorreu e o City foi o 11o clube a alcançar a façanha, uma vez que o Liverpool, o Ajax, o Milan e Manchester United já conseguiram ser campeões invictos em duas oportunidades.
Para além dos investimentos que se iniciaram em 2008, a conquista consolida um trabalho de, praticamente, sete anos, quando Pep Guardiola deixou o poderoso Bayern de Munique e resolveu se aventurar no competitivo futebol inglês. Sob o seu comando, o City conquistou 14 títulos: Premier League (5), Copa da Liga Inglesa (4), Supercopa da Inglaterra (2) e Copa da Inglaterra (2). Caro leitor, eu não errei a conta, o décimo quatro título era a cereja que faltava no bolo e o planejamento, a confiança no trabalho desenvolvido e a capacidade de superar as frustrações que ocorreram no período foram recompensados com a conquista da Champions. Óbvio que o dinheiro investido foi importante, mas ele, por si só, não representa o caminho das glórias e certamente o milionário francês Paris Saint-Germain é o melhor exemplo.
A decisão contra a esforçada equipe da Internazionale de Milão, ao contrário do que muitos esperavam, inclusive esse cronista, não foi fácil, apesar do City ter iniciado os primeiros minutos dando a pinta de que pressionaria muito o seu adversário. No entanto, a equipe italiana, sabendo que o seu oponente gosta de ter e trabalhar a bola, logo adiantou a sua marcação o que gerou bastante desconforto para a equipe da Inglaterra. A partir daí, o confronto ficou mais pegado e, apesar da melhor (e raríssima) oportunidade de gol ter sido do Manchester City, a Inter soube controlar e picotar o ritmo do jogo impedindo, dessa forma, que o costumeiro rolo compressor de Guardiola aplainasse o gramado do estádio Olímpico Atatürk, em Istambul, Turquia.
A rara e excelente oportunidade perdida pelo City ocorreu aos 26 minutos do primeiro tempo quando Haaland recebeu um passe açucarado de De Bruyne na área. O norueguês bateu forte, cruzado, mas goleiro Onana, muito bem colocado, espalmou com a mão esquerda. Muitos torcedores acreditaram que, a partir daí, o time inglês iniciaria a sua avalanche ofensiva, no entanto, três minutos depois, a esperança ganhou ares de drama quando o cérebro do time, De Bruyne, caiu em campo sentindo dores na parte posterior da coxa direita. Apesar da tentativa de continuar em campo, o atleta belga foi substituído, minutos depois, por Phil Foden.
O panorama inicial do segundo tempo não foi muito diferente, exceto pelo empenho da Inter na marcação que também se transformou em algumas jogadas de ataque perigosas. Aos 13 minutos, o argentino Lautaro Martinez, após o duplo e ridículo erro de Bernardo Silva e Akanji, entrou livre dentro da área e obrigou a primeira grande defesa de Éderson na partida. O susto parece ter acordado o City que passou a valorizar ainda mais a bola e em uma jogada envolvente, Bernardo Silva cruzou a bola da direita que foi cortada para o meio da área e encontrou o pé de Rodri que bateu forte para colocá-la no fundo das redes.
Sem outra opção, a Inter partiu para o tudo ou nada. Na estratégia chulamente denominada de “calça de veludo ou bumbum de fora”, a Inter dava espaços para o seu adversário que teve, nos pés de Phil Foden, a oportunidade de matar o jogo. O jogador inglês entrou livre dentro da área, mas chutou fraco, nas mãos de Onana. Foi o último suspiro ofensivo do City pois, a partir daí, Ederson, goleiro da equipe inglesa e o único brasileiro na decisão, se transformou no herói do confronto. O momento épico do atleta ocorreu aos 43 minutos quando Lukaku subiu dentro da pequena área e cabeceou para o gol, eu já dava como certo o empate e a prorrogação. A defesa do brasileiro foi simplesmente estúpida, inacreditável, sensacional, espetacular.
A pressão italiana seguiu, sem sucesso, até o apito final do árbitro do jogo. Guardiola, sempre muito intenso, ficou eufórico com a conquista, afinal o projeto desenhado há anos e que bateu na trave algumas vezes, agora se concretizou. O incansável e meticuloso treinador espanhol realizou mais uma temporada brilhante que culminou com a conquista da denominada Tríplice Coroa: a Premier League, a Copa da Inglaterra e a Champions League.
Eu confesso que, no jogo decisivo, esperava bem mais do Manchester City afinal ele conta com um elenco mais qualificado que o do seu adversário. Em determinado momento do jogo cheguei a enviar uma mensagem para um colega dizendo como o peso da camisa é importante nos momentos decisivos. O City, que buscava o seu primeiro título, parecia uma equipe ansiosa, desconfortável e que sentia a decisão. Já a Inter, mesmo sem o mesmo brilho técnico, estava mais à vontade, talvez por ser o franco-atirador, talvez por já ter levantado a Champions em outras três oportunidades ou, talvez, pelos dois motivos conjuntamente.
O certo é o que o City não conseguiu mostrar todo o seu poderio e, em muitos momentos do jogo, senti a falta do craque, do jogador que é capaz de quebrar, com uma rabiscada, com um drible, com uma arrancada, com um lançamento que nega todas as leis da física, o esquema defensivo montado pelo adversário. De qualquer forma, deu a lógica. O título foi justo e coroou a campanha impecável que os Citizens fizeram na temporada.