Autor: Luiz Henrique Borges
O calendário do futebol brasileiro começou a apertar. Acho uma loucura, para usar um adjetivo educado, o início das competições sul-americanas serem simultâneas às finais dos Estaduais. Para as equipes finalistas, não seria melhor se elas pudessem trabalhar toda a semana sem se preocuparem com outras competições? Acho que os nossos “competentes” dirigentes não pensam dessa forma, desvalorizando o seu próprio produto.
As questões do calendário, no entanto, não podem servir de desculpa para as derrotas do Palmeiras e do Flamengo pela Libertadores. O alviverde paulista, após ser sobrepujado pelo Água Santa no último domingo, para evitar a vergonha ocorrida em 1986, quando perdeu o título estadual para a Inter de Limeira, terá que vencer por dois gols de vantagem o seu adversário nesse final de semana. Caso triunfe por um gol de diferença, o campeão será conhecido na disputa de pênaltis. Talvez, por isso, o Palmeiras resolveu poupar os seus titulares de subirem “o morro” até La Paz para enfrentar o Bolívar.
A escalação gambiarra do Abel Ferreira não deu certo. Apesar das reclamações enfáticas do treinador português na coletiva após o jogo, culpando a arbitragem, a verdade, nua e crua, é que o alviverde jogou extremamente mal e a equipe local só não venceu com uma vantagem ainda maior porque o goleiro Marcelo Lomba realizou algumas defesas incríveis. Agora, é vencer o Água Santa e conquistar o Estadual ou, inacreditavelmente, a panela de pressão poderá esquentar lá na Academia.
No jogo do último domingo, a defesa palmeirense, normalmente muito firme, realizou uma partida irreconhecível. Não bastassem as falhas de marcação, o alviverde errou passes demais, inclusive o gol da vitória do Água Santa saiu de uma inversão equivocada feita por Marcos Rocha, e quando isso ocorre a força ofensiva vai para o espaço. Levando em conta as duas vitórias magras que classificaram o Palmeiras para a final (São Bernardo e Ituano) e a derrota no primeiro jogo para o Água Santa, que jogou muito melhor que o adversário, os torcedores palmeirenses devem estar com a pulga atrás da orelha.
No Rio de Janeiro, o Flamengo venceu o Fluminense e abriu uma vantagem confortável para o jogo decisivo. O rubro-negro começou pressionando o seu adversário, no entanto, os frequentes erros cometidos pela equipe ao longo do ano voltaram a aparecer. Após um primeiro tempo sofrível, a equipe da Gávea cresceu na etapa final e marcou os dois gols que lhe permitirão conquistar o título mesmo que seja derrotado pelo placar mínimo no próximo confronto.
Para quem achou que o Vitor Pereira, depois da vitória no Fla-Flu, enfim, teria uma semana tranquila, se equivocou completamente após a derrota da sua equipe para o fraquíssimo Aucas do Equador. O Professor Pardal que comanda o Flamengo, sempre soberbo, incapaz de dar, ao longo dos quatro meses de trabalho, uma mínima estrutura tática confiável para o time titular, resolveu escalar uma equipe reserva. O rubro-negro parecia muito mais um amontoado de jogadores do que uma equipe profissional de futebol.
A opção de Vítor Pereira por colocar diversos reservas em campo, a meu ver, não se sustenta e apresento dois motivos. Primeiro, a equipe titular ainda não está sólida e, segundo, para a decisão do estadual, o Flamengo construiu uma boa vantagem. Sendo assim, entendo que seria muito mais interessante e inteligente dar mais tempo de jogo, entrosamento e coesão para o time titular do que poupá-lo neste momento.
O atual campeão da Libertadores perdeu para uma equipe que tem como seu principal atleta o venezuelano Otero que, após uma boa passagem em 2017 pelo Atlético Mineiro, nunca mais mostrou um futebol convincente. O time do Aucas, estreante na competição continental, é de uma fragilidade ímpar e no “extremamente qualificado” campeonato equatoriano, entre os dezesseis times que o disputam, a equipe alvirrubra ocupa a incrível décima segunda posição.
Mesmo que o VP tenha resolvido poupar os seus titulares, ele conta com reservas de alto nível. Em que equipe brasileira Gabigol e Éverton Ribeiro seriam suplentes? Ainda podemos discutir se Vidal, Pablo, Rodrigo Caio, Filipe Luís e Marinho, mesmo distantes do auge físico e técnico, não seriam titulares absolutos e inquestionáveis na maioria dos clubes brasileiros e também sul-americanos, dentre eles o Aucas. A diferença técnica entre as equipes é imensa e nem mesmo a altitude é uma desculpa admissível para o resultado desfavorável.
Não considero que os resultados adversos do Flamengo e do Palmeiras coloquem em risco as suas classificações para a fase seguinte da Libertadores, mas os tropeços não podem mais ocorrer. Participando de um grupo mais difícil, o Fluminense escalou sua equipe titular, atuou bem e venceu com autoridade o Sporting Cristal. Paradoxalmente, apesar da vantagem construída pelo Flamengo, a boa largada na Libertadores, faz com que o tricolor chegue mais leve e embalado para a decisão do Carioca.
Se a derrota machucou o torcedor do Flamengo, o que realmente o irrita são as frequentes desculpas esfarrapadas de Vítor Pereira. É curioso que em todas os reveses, ele afirme que o time jogou bem e que o resultado foi injusto. A afirmação, na coletiva depois do jogo contra o Aucas, de que o Flamengo fez um bom jogo é equivocada, covarde e mentirosa. Por sinal, é uma característica do VP fugir de suas responsabilidades quando as suas equipes são derrotadas. O Flamengo é um time coletivamente bagunçado e que sobrevive graças aos sopros de individualidade dos seus jogadores.
Chego a pensar que o “genial” VP, em seu eurocentrismo lusitano, acha que é a única pessoa que entende de futebol em todo o Brasil e as críticas ao seu trabalho partem de completos imbecis, que nada sabem desse apaixonante esporte. A soberba não lhe permite perceber que a falta de honestidade e de humildade apenas inflama a torcida contra o seu trabalho. Independente do provável título carioca, o Vítor Pereira continuará na marca do pênalti e se ele começar mal o Brasileirão, para a felicidade da grande maioria dos rubro-negros, será substituído.
Caro VP, me convide para tomar uma boa dose de Ginja e ouça esse humilde cronista que estudou um pouco o futebol. O treinador que tenta, a qualquer custo, impor aos jogadores o seu esquema de jogo, mesmo que as características dos atletas não se adéquem ao modo de jogar desejado, costuma fracassar. Já o bom treinador, busca, a partir do capital humano que ele tem nas mãos, elaborar um esquema tático que maximize a qualidade técnica dos seus atletas. Não foi isso que o Dorival Júnior realizou no ano passado? Nem sempre a complexidade é sinônimo de qualidade.